sexta-feira, 7 de novembro de 2008

PAULO GUEDES - Entre a criatividade e a regulamentação

Segunda-feira, Novembro 03, 2008

Se ainda não entendeu o que ocorreu no mercado imobiliário americano nos últimos anos e está confuso sobre o estouro da bolha das ações de tecnologia no final dos anos 90, você precisa ler ‘John Maynard Keynes’, de Hyman Minsky (1975)”, anuncia a capa desta nova edição (2008) de uma interessante reinterpretação da “Teoria geral do emprego, dos juros e da moeda” (1936), de Keynes.

“Crises financeiras periódicas são uma parte inevitável da história de crescimento do capitalismo. A destruição criadora de Schumpeter se aplica ao mundo das finanças. Durante os bons tempos, a maior parte dos empreendimentos é bem-sucedida. Isso encoraja o endividamento excessivo e a redução das margens de segurança. Longos períodos de crescimento engendram crescente fragilidade financeira.

As inovações tornam-se mais complexas, criando-se sucessivas camadas de dívidas. Há sempre uma ameaça de falências em bola-de-neve nessa longa cadeia de compromissos financeiros. Torna-se inevitável o resgate do sistema bancário pelos bancos centrais.

Passos previsíveis dados por empreendedores, banqueiros, financistas e investidores disparam essa instável dinâmica. E a cada vez que as intervenções dos bancos centrais são bem-sucedidas, as arriscadas práticas financeiras são validadas — e inovações ainda mais ousadas são encorajadas. A fragilidade financeira torna-se uma tendência estrutural, desembocando em crises cada vez mais severas.” Esse é o alerta de Minsky.

Em “Estabilizando uma economia instável” (1986), Minsky aprofunda sua provocativa hipótese da instabilidade financeira do capitalismo. “O período bemsucedido de crescimento da economia leva à aceitação de práticas cada vez mais agressivas. A flexibilidade dos mecanismos de crédito é necessária à dinâmica capitalista, mas pode se tornar uma força altamente destrutiva. As instituições financeiras inovam e inventam em resposta às necessidades dos empreendimentos.

E as autoridades são sempre ‘surpreendidas’ pelas novas práticas dos mercados. O ritmo das inovações financeiras e o grau de aceitação de riscos aumentam à medida que as autoridades evitam as crises menores. A estabilidade desestabiliza. As inovações ampliam a liquidez, de modo a tornar o sistema mais vulnerável. A intervenção dos bancos centrais valida as inovações, estimulando a persistência das novas e arriscadas práticas. As crises financeiras tornam-se mais freqüentes e mais severas.” Adverte Minsky: “Todas as vezes que o banco central intervém, está protegendo instituições e práticas de financiamento imprudentes. Nada garante que isso não ocorrerá de novo sem uma regulamentação adequada.” Mas reconhece: “O capitalismo sem as práticas financeiras que levam à instabilidade pode ser menos inovador e expansionista. Diminuir a possibilidade de um desastre financeiro pode muito bem inibir as fagulhas de criatividade do sistema capitalista.”

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

O pior, depois de Bush - VINICIUS TORRES FREIRE

Pior da crise nos EUA está por vir; próximo presidente pode perder metade do mandato envolto em tensão social

O QUE PODE ser pior que o final do governo de George Bush?
Colapso financeiro, desemprego crescente, renda cadente, desigualdade social rampante, mentiras políticas, violação de direitos civis, desprestígio internacional, guerras irresolutas, enorme aumento da dívida pública, escárnio público da figura presidencial e o mais baixo e mais duradouro nível de impopularidade do presidente desde que tais pesquisas começaram a ser feitas, faz mais ou menos 70 anos. A lista de reveses poderia ocupar a coluna.
Governantes e administradores que herdam a terra arrasada talvez gostem de se encorajar com a idéia de que "do chão, não se passa", embora outro clichê reze que, abaixo da terra, há o inferno. A inépcia de George Bush parece de fato quase incomparável, mas também é extraordinário o nível a que baixaram as expectativas em relação a seu governo. O próximo presidente, porém, vai assumir o governo com uma conta alta de promessas e enormes restos a pagar em termos de problemas econômicos e sociais.
O confuso e bananeiro sistema de votação americano impede especulações sobre o partido vitorioso, nem a dimensão de seu sucesso. Mas se pode especular razoavelmente que, no caso da eleição de Barack Obama, tanto as esperanças como as cobranças de seus opositores serão bem maiores do que no caso de vitória de John McCain.
Nem se trata aqui das promessas de "refundação" do pacto americano, que transpareceu tantas vezes nos discursos de Obama, os quais, na oratória, na entonação e nos temas soavam algo proféticos. Também não se trata dos planos de reforma da saúde, nem do aumento de oportunidades educacionais, nem dos projetos de reformar a produção e o consumo de energia nos EUA.
O grosso da deterioração da economia dita "real" ainda está para vir, em 2009. O desemprego começa a crescer bem depois do início de recessões, e costuma durar um pouco além. Mas, desta vez, não se trata apenas de uma contração cíclica "comum". Os americanos perdem casas, poupanças de uma vida. Parece se encerrar o ciclo de duas décadas de endividamento pessoal e nacional. Muitos americanos perderão empregos; outros terão de liquidar dívidas e recompor a duras penas o patrimônio, a poupança da aposentadoria e a da educação dos filhos.
A economia americana é extraordinária e até excessivamente flexível. Os EUA têm os melhores centros de pesquisa e universidades, recrutam os melhores cérebros do planeta e ainda dispõem das maiores e mais inovadoras empresas. Mas tais condições são promissoras quando se pensa no médio prazo (um termo presidencial inteiro). No curto prazo, as condições econômicas e políticas serão duras. As demandas serão grandes, e a tensão será ainda maior num período de polarização social, pois é forte a ira popular ou populista contra "ricos" e "gatos gordos de Wall Street". No caso de um governo Obama, tal tensão pode ser maior.
A crise financeira ainda não terminou -a finança ainda sofrerá o rebote da crise na economia real. O humor social vai piorar. Até as condições de financiamento externo da economia americana tendem a piorar. Para Barack Obama ou John McCain, o melhor já passou.

sábado, 1 de novembro de 2008

Coração brasileiro está em perigo

Previsões são pessimistas: dentro de trinta anos os problemas cardiovasculares crescerão 200%. Solução? Mudança no estilo de vida.

Estatísticas indicam que doenças cardíacas têm aumentado entre homens e mulheres. A organização mundial da saúde projeta elevação de problemas cardiovasculares em países em desenvolvimento. A previsão é de que no Brasil haja crescimento de 200% até 2040.

Mulheres correm o mesmo perigo

A prevalência de doenças cardíacas nas mulheres atingiu praticamente o mesmo patamar dos homens, o que é compreensível: cada vez mais elas estão expostas aos mesmos fatores de risco - tabagismo, sedentarismo, obesidade, estresse, elevação do colesterol e ansiedade. As gorduras, especialmente as do tipo trans, encontradas em biscoitos, fast-food e batatas fritas, continuam sendo grandes inimigas do coração. Elas contêm o colesterol ruim, que leva à disfunção vasodilatadora e provoca formação de placas ateroscleróticas coronarianas.

De acordo com o médico cardiologista Alexandre Alessi, do Hospital Nossa Senhora das Graças, o único meio de prevenir problemas cardíacos é adotar estilo de vida saudável. Isso inclui a prática de atividade física, dieta saudável, peso corporal adequado, diminuição da ansiedade, combate ao colesterol total, e ao diabetes, evitar fumo e bebidas alcoólicas, controlar pressão arterial e visitar o médico periodicamente.

Prevenção já é conhecida há tempo

Segundo o cardiologista, riscos e formas de evitar os riscos já são conhecidos desde a década de 50, mas hoje há mais dois fatores importantes a serem levados em consideração: a característica genética ou familiar de maior prevalência de problemas cardíacos e o envelhecimento da população, que está associado a maior prevalência de doenças degenerativas cardiovasculares. “Sabemos também que há medicamentos que combatem os fatores de risco cardiovascular e tratam pacientes com problemas cardiológicos com excelente tolerabilidade e eficácia”, afirma.

Problemas do coração podem ter origem congênita e, geralmente, se manifestam na infância. Também há doenças que atingem válvulas cardíacas e músculo cardíaco, que pode ficar dilatado e reduzir a força contrátil do coração. A doença aterosclerótica leva à obstrução das artérias coronárias, provocando angina de peito (dor) ou infarto do miocárdio. Outros problemas são arritmias cardíacas (referentes à estrutura elétrica do coração) e hipertensão arterial.

Pulmão também é afetado

Problemas relacionados ao pulmão também estão ligados ao coração, pois esses dois órgãos trabalham juntos, por isso são comuns sintomas respiratórios em doenças cardíacas e alterações no coração causadas por doenças pulmonares.

O coração tem a função de bombear o sangue para corpo. Isso significa que o sangue venoso (não oxigenado) chega ao coração, passa pelos pulmões e volta ao coração, para que, na forma de sangue oxigenado seja distribuído para todas as partes do corpo. Qualquer problema nessa delicada tarefa pode ser fatal e por isso é necessário prevenir e evitar fatores de risco desde a infância.


Publicado por: Vida Integra

Um horizonte mais claro LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Nos próximos meses teremos uma idéia mais clara dos efeitos da redução do crédito sobre a atividade econômica


O MOMENTO mais grave da crise financeira que tomou conta do mundo pode ter sido alcançado na primeira quinzena deste mês. Os mercados chegaram à beira de um colapso em todos os seus segmentos, na medida em que ocorria uma verdadeira corrida pela compra da moeda norte-americana. Naqueles dias turbulentos e irracionais, a crise passou a adicionar um componente novo via mercados de câmbio e da dívida soberana nas economias emergentes como o Brasil.
O mercado, que vivia as tensões decorrentes da queda das Bolsas mundiais e da paralisia dos mercados de crédito no Primeiro Mundo, sofreu um novo abalo com a queda das cotações das moedas em relação ao dólar. A crise de liquidez nos mercados financeiros ganhou novas cores devido à grande movimentação de recursos em direção ao mercado de títulos públicos americano. Nós, no Brasil, sentimos esse movimento de forma clara, e o medo da inflação voltou a rondar nosso inconsciente.
Alguns países chegaram, inclusive, a aumentar os juros internos na vã tentativa de estabilizar a taxa de câmbio. Felizmente, a maioria dos bancos centrais no mundo emergente manteve a calma, trancou os dentes e deixou a questão da inflação para ser enfrentada depois. Até porque, a contração interna de crédito por conta da grande insegurança nos mercados seria suficiente para reduzir a demanda interna e evitar a espiral de preços. Rapidamente os líderes da grande cruzada internacional contra a depressão econômica identificaram esse novo front e tomaram medidas agressivas para enfrentar o novo desafio. O FMI (Fundo Monetário Internacional) criou linhas de financiamento emergencial para as nações mais ameaçadas, e o Fed (o banco central dos Estados Unidos) estendeu para alguns países suas operações de "swap" de dólar. São medidas corretas e eficientes para enfrentar esse novo foco de turbulência em um mundo já abalado por uma crise financeira de proporções gigantescas.
O Brasil recebeu o apoio de US$ 30 bilhões em um momento em que o Banco Central conduzia de forma agressiva suas operações para acalmar um mercado à beira de um ataque de nervos. Quando escrevo esta coluna, são claros os sinais de que a taxa de câmbio do real contra o dólar pode estar se estabilizando na faixa de R$ 2 e alguns centavos. Esse nível me parece adequado para enfrentar a queda das cotações de nossos principais produtos de exportação sem causar danos definitivos ao controle da inflação. Certamente, a inflação vai ficar acima do centro da meta em 2009, sem, entretanto, superar o intervalo de segurança. O Copom (Comitê de Política Monetária) foi perfeito ao decidir manter em 13,75% ao ano a taxa Selic em sua reunião desta semana e, principalmente, ao evitar declarações agressivas no sentido de poder voltar a subir os juros em futuro próximo. O mercado tem um grande respeito por nossa autoridade monetária e o Banco Central não precisa desse tipo de reforço, que apenas revela insegurança. Nos próximos meses teremos uma idéia mais clara dos efeitos da redução do crédito bancário sobre a atividade econômica. Até lá, vai haver um choque entre índices de inflação mais elevados e números bem mais modestos sobre consumo e investimento.
Será preciso sangue-frio e convicções sólidas para enfrentar esse período. Certamente não faltarão falcões a pedir o aumento dos juros e a pregar dias terríveis no campo da inflação. Mas a cautela do Copom me parece a melhor posição para enfrentar os próximos meses.

Contágio e conseqüência ALEXANDRE SCHWARTSMAN

Insistir em manter a demanda interna acelerada só trará mais depreciação cambial e mais inflação

HÁ PELO menos três canais por onde o impacto da crise nos afeta diretamente: comércio global, preços de commodities e, finalmente, fluxos de capitais.
A combinação deles deverá implicar não apenas a redução da taxa de crescimento, mas também uma alteração importante na sua composição, à medida que a demanda interna, fator preponderante da aceleração do crescimento nos últimos quatro anos, deverá encontrar limites bem mais claros à sua expansão.
De 2002 até meados deste ano a conjuntura internacional se mostrou extremamente favorável ao país. Sem desmerecer a adoção de políticas domésticas que, não tenho dúvida, ainda ajudarão o país a se diferenciar de vários de seus pares no futuro próximo, parcela relevante dos desenvolvimentos positivos no país se originou de fatores externos.
O país foi beneficiado, em primeiro lugar, pelo aumento de preços de commodities. Como exporta muito mais commodities do que importa, a alta resultou em preços de produtos exportados crescendo acima dos preços de importados, isto é, houve melhora dos termos de troca. Conjugada à expansão dos volumes exportados, em parte derivada da expansão do comércio global, essa melhora implicou forte elevação da capacidade de importar: entre 2002 e o terceiro trimestre de 2008, estima-se que o poder de compra das exportações tenha crescido 80%.
Esse processo permitiu que a demanda doméstica passasse a crescer acima da produção, o que não observávamos desde 1997/98, quando preços de commodities em queda haviam piorado nossos termos de troca. Obviamente, se a demanda doméstica cresce mais rápido que a produção, a diferença deve ser coberta com importações físicas crescendo acima das exportações físicas, o que foi possível principalmente pelo aumento do poder de compra das exportações. Completando esse quadro, a expansão da liquidez mundial barateou o financiamento, trazendo vastos volumes de capital estrangeiro, aparentes na expansão do investimento estrangeiro no país, em particular o investimento direto, que se acelerou de US$ 15 bilhões por ano entre 2002/5 para US$ 35 bilhões por ano em 2007/8.
Não há dúvida, porém, que esses três fatores mudaram de direção, isto é, podemos esperar queda de preços de commodities, desaceleração do comércio global e menores fluxos de capital. A resultante não poderia ser mais clara: a capacidade importadora se reduz e, portanto, também a diferença entre o crescimento da demanda doméstica e do produto deverá cair, revertendo o processo observado nos últimos anos.
Quem anuncia essa mudança, como seria de esperar, é o sistema de preços. Da mesma forma que a melhora externa se traduziu numa taxa real de câmbio mais forte, incentivando a demanda doméstica às expensas da demanda externa, a piora das condições internacionais requer o inverso, isto é, câmbio real mais depreciado, mesmo com a diferença entre os juros locais e os externos na verdade até mais alta do que no passado. Aliás, isso só demonstra o que venho há muito insistindo neste espaço, isto é, que a trajetória da taxa real de câmbio depende mais de variáveis externas do que a mera diferença de taxa de juros.
Em resumo, o choque externo reverteu as condições que permitiam o crescimento rápido da demanda doméstica com efeitos inflacionários mitigados (não eliminados) pela disponibilidade de importações. Insistir em manter a demanda doméstica acelerada só há de trazer mais depreciação cambial e inflação. Vamos tentar não repetir esse erro?

Zerar o déficit e travar os juros PAULO GUEDES

O argumento da suposta infalibilidade dos mercados em bases científicas e a pretensão de transformar economia e finanças em ciências exatas produzem perigosa mistificação: confundir brilhantes construções mentais para entender a realidade com a própria realidade. O problema dessa percepção ingênua dos fenômenos de mercado, como a crença nos mercados perfeitos, é que ela fornece exatamente o que seus mais ignorantes críticos utilizam como munição nos momentos de crise e descontinuidade.
Os mercados são instituições sociais evolucionárias.
São poderosos instrumentos de coordenação econômica em busca permanente de eficiência. Mas são também o espelho de nossos humores e nossos equívocos, refletindo nossa falibilidade nas avaliações.
São contaminados por excesso de otimismo e de pessimismo. São humanos, demasiado humanos, jamais serão “perfeitos”. Mas, se a idéia de “mercados eficientes” é apenas uma hipótese operacional do mundo acadêmico, o que dizer de sua desinformada antítese, a idéia da “perversidade intrínseca aos mercados”, evocação nostálgica de ideologias obsoletas? Os mercados, assim como a linguagem, são meros instrumentos de comunicação e coordenação social, muito aquém do bem e do mal.
Ao longo das últimas duas décadas, as economias de mercado ocidentais tiveram de absorver ondas sucessivas de inovações tecnológicas, integrar 3,5 bilhões de eurasianos a seus mercados de trabalho, acomodando seu excesso de poupança e sua demanda por recursos naturais. Tudo isso em meio ao formidável “big bang” da liquidez global promovido em grande parte pelo Federal Reserve, o banco central americano. O ritmo extraordinário da criação de riqueza durante o período de globalização acelerada é irrefutável. Mas não há instituições humanas perfeitas, muito menos mercados financeiros.
O crédito é pró-cíclico, como uma sanfona que se expande e se contrai no mesmo ritmo da economia.
Essa elasticidade do sistema financeiro aumenta a oferta de fundos em resposta às novas oportunidades de investimento durante as fases de crescimento mais rápido, mas depois encurta o crédito abruptamente, quando há uma reversão de expectativas. A atual liquidação forçada de ativos e as enormes perdas de capital decorrentes são digitais inequívocas do excesso de alavancagem do sistema financeiro.
No Brasil, temos, como sempre, um banco central hiperativo, isolado no enfrentamento da crise.
A melhor resposta do governo seria um apoio decisivo da política fiscal. Zerar o déficit nominal daria contornos estratégicos à necessária ampliação da liquidez e à interrupção imediata da alta dos juros.
A maior dose de esforço fiscal daria consistência a uma nova política de juros mais baixos e câmbio mais alto, armas a que recorrem os bancos centrais em todo o mundo na guerra mundial por empregos deflagrada pela grande contração.

Da marola ao tsunami LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Os ventos externos -agora gelados e fortes- chocaram-se com o ar quente do otimismo de todos. Podem estar certos os leitores da Folha que o impacto sobre as empresas e os consumidores vai ser muito duro e duradouro.
Felizmente para todos nós, a cortina de fumaça não paralisou o Banco Central. Enquanto o ministro da Fazenda seguia o tortuoso e perigoso caminho de negar os problemas reais, o Banco Central agiu.
Tomou medidas agressivas para lidar com a questão da liquidez dos bancos de médio porte, reduzindo o compulsório e criando incentivos para a venda de carteiras de crédito dos bancos em dificuldades. Disponibilizou dólares de sua reserva para destravar as operações de financiamento ao comércio exterior. Injetou liquidez nos mercados de câmbio, agindo nos mercados "spot" e de derivativos.
Por fim, criou mecanismos legais no caso de ser necessária uma infusão de capital nas instituições com problemas de solvência. Apesar da grita contra uma possível estatização de prejuízos, não existe no momento uma alternativa para evitar a quebra de bancos e o aprofundamento da crise. Enfrentamos hoje os mesmos resmungos ouvidos nos Estados Unidos e na Europa há poucos meses. Sugiro a leitura da revista inglesa "The Economist" desta semana para que se possa digerir com menos dificuldades a medida provisória nº 443, assinada na terça-feira.
Aqui, como no exterior, vamos ter de usar o Estado para evitar o mal maior de uma recessão profunda. O que a sociedade deve exigir é que esse movimento, se necessário, seja feito com transparência e fiscalização externa. Como nos Estados Unidos, o Congresso Nacional deve criar uma comissão para acompanhar a utilização desse mecanismo extraordinário.

Regras fundamentais

Hoje é comum surgirem comparações com a Grande Depressão dos Anos 30, que durou praticamente uma década. Nada mais falso. A rapidez na transmissão de informações, o desenvolvimento das “tecnologias” de política econômica e a espantosa agilidade de ajustamento dos mercados globalizados comprimem fortemente o prazo de qualquer crise.
Anos viraram meses, meses viraram dias e ficará para trás quem não se der conta da nova realidade.
Nas Bolsas de Valores de todo o mundo vemos o exemplo mais marcante desse novo “tempo”. E, para as ações brasileiras, a história não é diferente.
Faz poucos meses e nossos analistas se entusiasmavam com o “grau de investimento” concedido ao Brasil pelas agências de risco. Hoje, nossas principais empresas já valem em dólar apenas cerca de 35% do que chegaram a valer. E já tivemos dias piores! Na lida do mercado acionário aprendemos três regras fundamentais. Uma, freqüentemente lembrada por investidores do calibre de Warren Buffet, é que “se vende ao som dos violinos e se compra no trovejar dos canhões”, ou seja, nada de acreditar que estados de euforia ou depressão são permanentes.
Nesses momentos, sempre agir na contramão dos ansiosos e apressados. Outra é que, “no mercado, se come como pinto e se defeca como pato”, tradução do fato de que a perda da confiança se dá em velocidade bem maior do que a sua conquista. A terceira regra, finalmente, ensina que “se compra no boato e se vende no fato”, refletindo a constatação de que a Bolsa lida com expectativas, antecipando-se de muito aos acontecimentos futuros.
É certo que da teoria para o timing perfeito vai uma grande distância.
Mas fica a lembrança dessas regras e de que vivemos em um novo “tempo” para que nossos investidores pensem com frieza e não se deixem tomar por momentos de depressão e pânico, efêmeros por natureza e, seguramente, maus conselheiros.

RUBEM DE FREITAS NOVAES é economista.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Análise das conseqüências geopolíticas da crise

O historiador Niall Ferguson, da Universidade de Harvard, que prepara para o mês que vem o lançamento de seu livro “The ascent of Money: a Financial History of the World” (“A ascensão do dinheiro: uma história financeira do mundo”), fez em seu blog uma análise das conseqüências geopolíticas da crise e concluiu que se deve hesitar sempre ao decretar o declínio e queda dos Estados Unidos: “A América já passou antes por crises financeiras desastrosas — não apenas a Grande Depressão, mas também a Grande Estagflação dos anos 1970 — e emergiu com sua posição geopolítica fortalecida.
Essas crises, por piores que tenham sido em casa, sempre tiveram os piores efeitos nos rivais da América”.
Ele lembra que até o momento os piores resultados de mercados de ações têm sido da China e da Rússia, “números que não são boas propagandas para os modelos de economia mais controlados pelo governo adotados por Pequim e Moscou”. Mas Ferguson admite que os Estados Unidos crescerão menos a partir de agora, e provavelmente a China se tornará a maior economia do mundo antes de 2027, prazo previsto pela Goldman Sachs em seu estudo sobre as economias emergentes dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China).
O historiador prevê também que, a exemplo do que aconteceu com a libra inglesa, o dólar poderá perder a propriedade de ser a única moeda de referência mundial. Também o sociólogo e historiador brasileiro Hélio Jaguaribe acha que “a emergência, da China como grande potência já está definida e se realizará com celeridade, na segunda década deste século, já deverá transcorrer sendo a China uma segunda potência mundial.

Compra de terras por estrangeiros e soberania - Revista Veja

Nos últimos quatro anos, o investimento externo no mercado imobiliário brasileiro cresceu 347%. Segundo um levantamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), há 4 milhões de hectares de terras na mão de estrangeiros (5,5 milhões, se forem consideradas as propriedades sem registro no órgão). O que, na calculadora, representa apenas 0,47% da área total do país, aos olhos de uma parcela do governo petista, é uma verdadeira invasão do território nacional.

A lei que rege a participação estrangeira em propriedades rurais é de 1971 e foi feita no espírito protecionista do regime militar. A regra, válida até hoje, estabelece que cidadãos de outros países podem ser donos de, no máximo, 5 000 hectares de terras. Dependendo do tamanho do município onde se encontra a propriedade, o limite pode ser ainda menor. Para empresas, a área não pode exceder 10 000 hectares.

Em algumas regiões, o agronegócio explodiu graças a essa nova figura jurídica. No oeste baiano, por exemplo, 20% da área agrícola é cultivada por grupos estrangeiros. "O interesse no exterior por terras brasileiras cresceu ainda mais com o recente aumento do preço dos alimentos", diz o especialista em direito agrário Márcio Mattos, de São Paulo.

Mas não é no oeste da Bahia, ou em outras regiões agrícolas, que reside a preocupação dos que vêem no avanço dos proprietários estrangeiros de terra uma ameaça à soberania nacional. A Amazônia é que é o problema. Volta e meia circulam boatos de que nações ricas têm planos de internacionalizar a Amazônia.

-como garantir que o estado brasileiro possa exercer sua soberania se os estrangeiros forem donos de grandes extensões do território? Soberania, numa definição ligeira, é a autoridade exclusiva que uma entidade política (o rei ou o estado republicano) tem sobre determinado território. A soberania pode ser interna, quando exerce o controle sobre o que ocorre dentro de suas fronteiras, ou externa, quando se refere à relação igualitária com outras entidades soberanas (ou seja, outros estados).

A soberania é um conceito tão maleável e relativo que, recentemente, dois países a usaram como justificativa para posições completamente opostas. Em agosto deste ano, o Exército da Geórgia, no Cáucaso, atacou milícias separatistas dentro do seu território, em uma tentativa legítima de recuperar a soberania perdida. Em resposta, a Rússia invadiu o país, com o argumento de que exercia o seu direito – soberano – de proteger os cidadãos russos que residem na Ossétia do Sul, a região separatista em questão.Ou seja, o estado russo teria o direito de usar a força para defender seu povo, onde quer que ele esteja. "Por essa lógica, o Exército brasileiro poderia entrar no Paraguai para proteger os brasiguaios, cujas fazendas estão sendo queimadas e saqueadas por sem-terra daquele país", diz o historiador Marco Antonio Villa, de São Paulo.

o fato é que a propriedade privada, esteja ou não na mão de estrangeiros, não é uma ameaça à soberania de um país – desde que o estado seja capaz de fiscalizar e controlar o seu uso. Na Amazônia, onde não se consegue coibir o tráfico de drogas nem obrigar os brasileiros natos a cumprir as leis ambientais, o que existe é um caso de omissão total no exercício da soberania por parte do estado.

Para mascarar a realidade, usa-se o fantasma, eivado de ideologia, da "ameaça estrangeira". "É mais fácil evocar a defesa da soberania, um termo com apelo popular que costuma ser associado ao sentimento de patriotismo, do que reconhecer a incompetência estatal para controlar o que acontece dentro do seu território", diz o paulista Fernando do Couto Henriques Júnior, doutor em direito internacional pela Universidade de São Paulo com uma tese sobre soberania.

Trecho Entrevista do francês Luc Ferry

O francês Luc Ferry, de 57 anos, é um caso raro de filósofo que transforma seus livros em best-sellers. Sua obra Aprender a Viver, lançada em 2006, vendeu 700 000 exemplares, 40 000 deles no Brasil. Seu segredo é combinar formação acadêmica sólida com um texto leve e bem-humorado. Ferry se alinha com o chamado humanismo secular.

- Há um descontentamento generalizado no mundo moderno. A sociedade se interessa mais pelos meios em si do que pelos fins. Um olhar sobre o Iluminismo ajuda a compreender esse novo mundo. As mentes mais brilhantes do século XVIII buscavam nas ciências e nas artes emancipar a humanidade do obscurantismo da Idade Média. Tudo era feito com o objetivo de, no fim, alcançar a liberdade e a felicidade. Hoje, o movimento das sociedades não se inspira em ideais superiores em termos de civilização. A sociedade se movimenta no sentido de estabelecer a concorrência acirrada entre todos os indivíduos, sem objetivos finais claros. A história não se move pela aspiração a um mundo melhor, mas pela ação mecânica da competição. O êxito pessoal é o que importa. Precisamos ter poder, dinheiro, um carro novo, uma mulher nova, os filhos mais bonitos, tudo para conseguir o reconhecimento alheio e nos sentir superiores aos outros. Como dizia o filósofo romano Sêneca, enquanto esperamos viver, a vida passa rapidamente.

- Desde sempre o ser humano vive seus conflitos e tenta gerenciá-los da forma que pode. Hoje, vivemos na era do hiperconsumo. O que nos dá a sensação de progredir, de ser felizes, pelo menos momentanea-mente, é comprar, comprar e comprar. Claro que isso não basta. A lógica contemporânea aumenta a insatisfação e nos incute medos cotidianos e recorrentes.

- Nós, ocidentais, temos medo de tudo. Da velocidade, do sexo, do álcool, do tabaco, da carne vermelha, de frango, da Europa, do efeito estufa, da globalização, das notas escolares das crianças, e por aí vai.O medo é uma das paixões dominantes das sociedades democráticas. Ele não existia dessa forma no Iluminismo. Quando eu era criança, era feio ter medo. Superá-lo era um dos marcos da chegada à idade adulta. Hoje, ter medo não implica culpa. É através do medo que os movimentos ecológicos radicais, por exemplo, se impõem.

-Qualquer ameaça, como o terrorismo, o aquecimento global ou a gripe aviária, desperta uma neurose global. A angústia que essa histeria causa individualmente é mais prejudicial do que a ameaça a que ela se contrapõe.

- "A sociedade atual não se inspira em ideais superiores em termos de civilização, como no Iluminismo. O que nos dá a sensação de progredir é comprar, comprar, comprar. Essa lógica apenas aumenta nossa insatisfação"

terça-feira, 21 de outubro de 2008

ATLETAS X CALORIAS

Atletas 'queimam mais calorias' mesmo em repouso

Da BBC Brasil

Atletas que têm um bom preparo físico queimam mais calorias do que quem não faz exercícios regularmente mesmo quando estão descansando, segundo um estudo publicado pela revista acadêmica Proceedings of the National Academy of Sciences.
Isso porque, segundo pesquisadores da Yale University, em Connecticut, nos Estados Unidos, quem passa por treinamento intensivo de resistência têm um metabolismo muscular mais acelerado do que as pessoas que não têm um bom preparo físico mesmo quando não estão se exercitando.

Os pesquisadores compararam os níveis de oxidação e de síntese de ATP (trifosfato de adenosina, molécula responsável por armazenar energia nas células) nos músculos da panturrilha de corredores de longa distância e de pessoas sedentárias durante períodos em que os dois grupos estavam de repouso.

Embora a oxidação tenha se mostrado em média 54% maior nos atletas, as taxas de síntese de ATP durante o descanso eram parecidas nos dois grupos.

A oxidação é o processo pelo qual as mitocôndrias, cuja principal função é a geração de energia por meio das moléculas de ATP, consomem material que será transformado em energia - processo também conhecido como a queima de calorias.

O resultado é que, apesar de não produzirem mais energia nos momentos de descanso, os atletas queimam mais calorias. Segundo os pesquisadores, o estudo indica que os músculos dos atletas convertem constantemente mais energia em calor do que os de indivíduos sedentários.

O experimento contou com a participação de oito voluntários que não fazem exercícios físicos regularmente e de sete atletas. A comparação foi feita levando em conta a idade, o peso e a altura dos participantes.

Os resultados também sugerem que exercícios têm ainda mais benefícios contra o diabetes do que se pensava anteriormente. O treinamento aeróbico intenso é capaz de reverter a resistência à insulina, um fator importante para o desenvolvimento de diabetes.

Segundo os pesquisadores, a nova pesquisa indica que a dissociação da oxidação e da produção de ATP pode representar uma outra forma pela qual o exercício aumenta a sensibilidade à insulina e a queima de calorias em excesso.

BBC Brasil

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Jacu Coffee, o nosso Kopi Luwak


Como é que começou esta história do jacu coffee?

A fazenda é cercada por várias matas, mata virgem e o jacu começou a migrar para comer o café e ia começar a dar prejuízo. Aí a gente chegou a pedir autorização para com eses jacus. Daí veio a notícia do café da Sumatra. Dái a a gente pegou o café de jacu fez um teste deu certo.


Henrique Sloper de Araújo, formado nos Estados Unidos em comércio exterior é o dono da fazenda Camocim.

“Qual a diferença do jacu coffee para o café da Sumatra?”, pergunta o repórter.

“A diferença básica é o processo do animal. O Sumatra ele faz uma digestão mais lenta, é um mamífero. O jacu ele faz a digestão muito mais rápido”, explica o dono.

E quanto que custa o jacu coffee? “Ele não tem preço. A gente faz o que a gente pode em uma no, é uma coisa que a natureza nos dá, a gente não tem certeza da quantidade que vamos produzir e a gente oferece aos nosso clientes e daí faz um preço de acorodo com a procura deles”, conta.

Já em São Paulo, levamos o café jacu ao centro de preparação de café do Sindicato da Cafeicultura de São Paulo. Quem vai prová-lo é a doutora Eliana Almeida, engenheira de alimentos e juradas de concursos de café.

Levamos o café jacu junto com o café da região do Espírito Santo, ambos apenas numerados, sem que a doutora Eliana soubesse qual era um qual era o outro.

Ela começou cheirando o café torrado, sentiou as outras fases até armar a mesa. Testou cada um mais de uma vez.

“Eu gostei deste café, achei que ele está com baixa adstringência, bom corpo, achei que ele é um café bem equilibrado, não tem nada nele que ressalte. Número 1. Eu daria uma nota maior para o número 2. É raro você comprar um café com esta complexidade, com esta leveza e este café número dois, parece um licor. O gosto que fica depois é mais leve. Eu daria uns 90 para o número 3 e 80 para o número 1”, afirma Eliana.

O número dois é justo o café jacu.

O café jacu, que é raro e caro, vai quase todo para a Europa e os Estados Unidos.

“No tempo dos faraós e dos imperadores” - Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa

Há os que pedem para o Lula se calar. Pois eu, não. Imaginem perder essa maravilha: Lula, reunido com o presidente de Moçambique, indignado ao saber que a ajuda de R$10 milhões de dólares que prometera cinco anos atrás ao país africano ainda não chegara lá, reagiu à explicação de seu chanceler, de que a culpa era da burocracia. E saiu-se com esta, dirigindo-se ao chefe do estado moçambicano:

“No tempo em que você tinha os faraós e os imperadores, isso não acontecia”. Todos os brasileiros da imensa equipe do presidente sorriram e olharam para os moçambicanos com ar de quem diz “ele não é uma simpatia?”. Dificilmente um amigo que promete essa pequena fortuna não vai ser encarado como simpático, mesmo que Moçambique tenha que reescrever sua história e colocar lá uns faraós. Com certeza estão até agora se perguntando onde foi que o Lula pescou um faraó em Moçambique...

Cafe' das " FEZES" do Lwak e' o mais caro do mundo



“É raro e tem algo diferente. Com o processamento que ocorre dentro do animal, e depois que você prepara, ele fica com um aroma intenso, que lembra aroma de café, caracteristicamente de café. É doce e lembra muito um chocolate amargo, um chocolate prazeroso”, afirmou.




Segundo Leite, o luwak come os grãos de cafés, que passam por um processo natural de fermentação no aparelho digestivo do animal. Isso, segundo ele, proporciona ao produto o sabor achocolatado. "Mas a primeira coisa que se destaca no produto é que ele raro", diz.

Segundo a revista "Galileu", não existem registros precisos sobre a história do Kopi Luwak, mas acredita-se que a origem data de cerca de 200 anos atrás, quando os colonizadores holandeses iniciaram plantações de café nas ilhas de Java, Sumatra e Sulawesi, onde hoje é a Indonésia.

O Kopi Luwak é fabricado à base de grãos recolhidos das fezes de um animal da Indonésia, o luwak. São produzidos somente 230 quilos por ano. O quilo custa cerca de R$ 1.500.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Doces permitidos


Delicias a base de frutas podem ser consumidas sem culpa em pequenas quantidades, assim como o chocolate amargo


Por Fátima Martin

Aquela vontade de comer uma barra de chocolate, de cereal ou uma porção de compota de frutas após do almoço faz a boca salivar só de imaginar a primeira mordida. Esse desejo aguça também a consciência, que geralmente fala mais alto: Será que devo? Afinal, é só um docinho?

Independentemente do tamanho da porção, aquele pedacinho de doce, que parece inofensivo ao organismo, pode comprometer a sua dieta se for ingerido em horário indevido, além de estimular, e muito, a vontade de comer.

Para a nutróloga Tamara Mazaracki, membro da Abran - Associação Brasileira de Nutrologia e especialista em medicina ortomolecular, o doce é permitido também para atletas, mas deve ser consumido em pequenas porções. “Para os corredores que não precisam perder peso e malham pesado todos os dias, é permitido o consumo de doces até quatro vezes por semana. Já nos dias em que não tiver que treinar, o doce, como uma barra de chocolate ou uma fatia de goiabada, por exemplo, deve ser substituído pelo iogurte ou fruta”, disse Tamara.

Os doces à base de frutas são os mais indicados pelos benefícios das frutas e absorção no organismo. “Goiabada, bananada, compotas em geral, como de figo, e cocada podem ser consumidos em porções de 30 g a 40 g. Como a maioria das frutas possui uma fibra chamada pectina, que atua na redução do colesterol e evita picos de insulina no corpo, elas são bem mais saudáveis do que outros tipos de doces. Mas lembre-se de não exagerar”, recomendou Tamara.
As frutas mais indicadas para praticantes de corrida, segundo a nutricionista Jane Corona, formada pela École Le Cordon Bleu, em Paris, na França, são frutas que tenham potássio, pois dão bastante energia. “Consumir sucos de banana, laranja, abacaxi, abacate e açaí e, de preferência, bater as frutas sempre com duas amêndoas e castanhas, pois são ricas em minerais”, sugere.

O melhor momento para comer doces e evitar peso na consciência é após a atividade física. “Antes do treinamento ou de uma prova é ideal consumir carboidratos de absorção lenta, ou seja, integrais, como aveia, uma fatia de pão, para que o corpo tenha tempo de absorver o alimento lentamente. Após a prova, os músculos precisam de mais energia, por isso, esse é o melhor momento de consumir doces, como saches de gel de carboidrato, sucos de frutas mais pesados, como de banana, por exemplo, pois o organismo não terá tempo de absorver o açúcar, que se transformará em glicogênio para suprir as necessidades do corpo, como a do fígado”, explicou a nutróloga Tamara.

Para saciar a vontade de comer doce sem exagerar no consumo de açúcar, o ideal é compor o doce com outro alimento, como o tradicional “Romeu e Julieta”, uma fatia de goiabada com outra de queijo.

Doces guardados a quatro chaves
Os bolos e tortas são preparados com margarina ou gordura vegetal, que são ricos em gordura trans, extremamente danosa ao organismo, pois pode causar o aumento da produção de radicais livres, além de aumentar o colesterol ruim e trazer doenças degenerativas e problemas cardiovasculares. “Por causa do desgaste do corpo do atleta, o corpo pede mais doces. Existe uma necessidade maior em carboidrato em geral para repor o glicogênio. Porém, ele deve evitar esses tipos de doces a base de massa, que deve ser consumido no máximo a cada dez dias”, afirmou Tamara.

Os doces campeões que você deve manter distância ainda são os aqueles feitos à base de leite integral e gordura saturada, como o doce de leite e brigadeiro, que devem ser consumidor no máximo a cada 15 dias.

Chocolate: pode ou não pode?
Ao contrário dos chocolates ao leite, o meio-amargo e amargo são permitidos, pois possuem entre 60% a 70% de cacau e são ricos em compostos fenólicos, responsáveis em inibem os radicais livres, produzidos durante a corrida.

Acima do peso
Os atletas que estão um pouco acima do peso devem evitar ao máximo a ingestão de doces, sejam à base de frutas ou de leite. ”O único momento que pode ser liberado o doce é logo após o exercício físico, porém em menor quantidade. Um doce de bananinha individual, um copo de suco de frutas ou 20 gramas de chocolate, ou seja, dois tabletes da barra grande de chocolate. Caso contrário, o corredor nunca vai conseguir perder os quilos extras. O ideal mesmo é a pessoa evitar os doces em geral até chegar à massa corporal adequada. Até lá, poderá consumir frutas com iogurte desnatado ou queijo”, conclui Tamara.

Atletas com taxa metabólica muito alta, que têm atividade intensa durante a semana inteira, ao reduzirem a atividade também devem diminuir consideravelmente o consumo de alimentos para não engordarem de uma hora para a outra.

A especialista em Nutrologia e chef de cozinha, Jane Corona, sugere cinco sobremesas mais leves para compor o cardápio da semana:

:: Mousse de manga
Rendimento: 2 porções

Ingredientes
1 manga
2 castanhas-do-pará
½ xícara (de chá) de água

Modo de preparo
Bata no liquidificador a manga com a castanha e a água. Coloque na geladeira para pegar consistência.

:: Mousse de Mamão
Rendimento: 2 porções

Ingredientes
¼ de mamão grande
2 castanhas-do-pará
1 colher (de chá) de groselha

Modo de preparo
Bata no liquidificador o mamão com a groselha e as castanhas. Coloque na geladeira para ficar consistente.

:: Merengue de Clara
Rendimento: 2 porções

Ingredientes
2 claras
1 colher (de sopa) de açúcar
4 gotas de limão
2 bananas

Modo de preparo
Bata na batedeira as duas claras e adicione aos poucos o açúcar até dar a consistência de suspiro. Inclua as gotas de limão. Corte as bananas em rodelas e coloque-as para tostar no forno até ficarem coradas. Faça camadas de bananas e suspiros.

:: Gelatina light
Rendimento: 4 porções

Ingredientes
4 copos de suco de laranja ou de outra fruta
1 pacote de gelatina branca sem sabor

Modo de preparo
Aqueça ligeiramente o suco de fruta e misture com a gelatina. Coloque em quatro recipientes e leve à geladeira.

Dica de nutrição: todo corredor precisa saber

1 – Nunca faça atividade física em jejum. Assim, o corpo estará queimando músculos e acumulando gorduras na tentativa de preservar o seu organismo.

2 – Antes da atividade física, escolha alimentos que dêem energia, como os carboidratos encontrados em pães, biscoitos, bolos, barras de cereais, frutas in natura, frutas secas, géis de carboidrato etc. Sugestões de combinações:
• barra de cereais e suco de frutas;
• pão com geléia de frutas;
• bolo sem recheio e água de coco;
• uva passa e biscoitos;
• banana com aveia.

3 – Consuma proteínas com baixo teor de gordura em todas as refeições. Leite e iogurtes desnatados ou light, queijo fresco, ricota e peito de peru são boas opções para o café da manhã e lanches, enquanto ovos e as carnes magras, como patinho, filé mignon, alcatra, lagarto, frango sem pele e peixes, podem ser consumidos nas principais refeições. As proteínas são essenciais para a manutenção dos tecidos e recuperação das fibras musculares.

4 – Varie ao máximo o consumo de frutas, verduras e legumes. Elas são fontes de vitaminas e sais minerais, presentes no processo metabólico. Quanto mais colorida for a salada, mais saudável ela será. Consuma também pelo menos uma fruta cítrica por dia como: laranja, acerola, goiaba, caju e morango. Ela dará a quantidade mínima de vitamina C que o seu corpo precisa no dia.

5 – Hidrate-se bem durante todo o dia e não apenas na hora de treinar. Em exercícios com mais de uma hora de duração ou em ambientes muito secos e quentes, consuma também bebidas esportivas para repor os eletrólitos perdidos no suor.

6 – Fracione bem a suas refeições e coma de três em três horas. Com isso, o metabolismo pode acelerar em até 20% e a fome diminui nas próximas refeições. Faça pequenos lanches entre o café da manhã e o almoço e entre o almoço e o jantar. Se a atividade física for realizada no final da tarde ou à noite, faça um lanche rico em carboidratos pelo menos 2 horas antes.

7 – Aumente o consumo de fibras na dieta. Elas dão sensação de saciedade, são ricas em minerais e ajudam no trânsito intestinal. Entre os alimentos com grande concentração de fibras estão arroz integral, barra de cereais, feijão, lentilha, ervilha, folhas e frutas com casca e bagaço.

8 – Evite excesso de carboidratos à noite. São alimentos muito energéticos e no período da noite não temos muito gasto calórico, pois o metabolismo está mais lento. Isso faz com que esses alimentos sejam transformados em gordura e estocados nas regiões onde menos se deseja: abdômen, glúteos e culotes.

9 – Diminua o consumo de bebidas alcoólicas. Elas são altamente energéticas e fornecem sete calorias para cada grama de álcool. Além disso, fazem cair o rendimento na atividade física e provocam a desidratação. Consuma somente nos finais de semana e com moderação.

10 – Consuma pelo menos três porções de frutas in natura por dia e de preferência de maneira variada. Você pode ainda combiná-las com uma porção de frutas oleaginosas, como castanhas, nozes e amêndoas. Elas são poderosas fontes de antioxidantes e de gorduras saudáveis (mono e poliinsaturadas). Mas não exagere, pois são altamente calóricas. Use a medida de 3 castanhas ou 2 nozes por porção.

Fonte: Sylvia Gracie, nutricionista formada pelo Centro Universitário São Camilo, em São Paulo.

As ameaças que pairam sobre as empresas - Miriam Leitao

Está faltando dinheiro para muita gente e crédito, que é o oxigênio da economia. As empresas brasileiras estão enfrentando vários problemas: prejuízos na operação com o dólar no mercado futuro; falta de capacidade de financiar suas exportações; cancelamento de investimentos; suspensão de negócios; e até brigas comerciais pela redução de preços já registrados em contrato.

A loja de varejo Renner anunciou oficialmente que não vai mais comprar a Leader Magazine. A Duratex disse que adiou por seis meses os investimentos. A Inbev adiou o lançamento de ações que ela faria para comprar uma cervejaria nos Estados Unidos.

A Arcelor Mittal, que tem várias siderúrgicas no Brasil, avisou que está revendo os investimentos. A Arcelor é a maior cliente da Vale e está querendo reduzir o preço do minério estabelecido no contrato.

O presidente da Única, que reúne as usinas de cana-de-açúcar, acha que pode haver cancelamento de projetos. A empresa de Eike Batista cancelou o investimento num porto. A Votorantim também está engavetando a idéia de disputar um terminal no Rio de Janeiro. As construtoras cancelaram projetos. Dentro da cadeia produtiva, as decisões estão sendo tomadas diariamente. Isso porque a crise chegou aqui de forma abrupta, por meio do câmbio.

As grandes empresas financiavam seu capital de giro com as operações de venda antecipada de exportação. Era assim: o exportador ia ao banco com o contrato do que iria daqui a três ou seis meses, recebia os dólares antes e vendia. Com este dinheiro, ele se financiava e aplicava no mercado tendo grandes lucros. Agora, o banco não consegue mais a linha de crédito lá fora e, por isso, não faz a operação de antecipação do câmbio com a empresa.

O fluxo secou de uma hora para outra. Essas linhas de crédito caíram 80%. Além disso, as empresas têm medo da desaceleração da economia. As ações do governo não têm conseguido mudar essa situação.

Dinheirama não evita medo da recessão

Restaurar a confiança é mais difícil que injetar bilhões de dólares na economia. O problema é que injetam o dinheiro por meio dos bancos, e os bancos não passam adiante.

O presidente George Bush deveria desistir de fazer pronunciamentos dizendo que a crise vai ser vencida. A cada vez que ele fala, a Bolsa cai. Ontem Dow Jones estava subindo e caiu.

Quando o secretário do Tesouro, Henry Paulson, falou, foi para anunciar que está distribuindo bilhões aos bancos. Citibank, Bank of America, JP Morgan Chase e Wells Fargo vão receber US$ 25 bilhões cada um. Goldman Sachs, onde trabalhava Paulson, e Morgan Stanley receberão US$ 10 bilhões cada um.

Os cheques menores estão sendo distribuídos pelos bancos em compra de ações preferenciais, que não têm direito a voto. Assim, o governo americano finge que não é exatamente uma estatização.

Na Europa, o governo terá diretores dentro dos bancos. É difícil saber o que é pior: o governo entrando só com o dinheiro do contribuinte e não mandando nada ou o governo administrando bancos.

Essa dinheirama é para evitar o pânico, mas não evita o segundo maior medo: o da recessão. Ontem, várias empresas anunciaram prejuízos ou cancelamento de projetos nos Estados Unidos.

O economista que previu esta crise, Nouriel Roubini, disse que a recessão americana será a maior em 40 anos e vai durar de 18 a 24 meses. O desemprego subirá para 9%.

A origem da crise, a queda dos preços dos imóveis, vai continuar. Os preços vão cair mais 15%, calcula o economista. Nouriel Roubini acha também que o rombo no mercado financeiro terá um custo de US$ 3 trilhões.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Euforia dá lugar à realidade - Miriam Leitao

Passada a euforia inicial com o pacote europeu, os investidores agora se dão conta de que o mundo precisará de um bom tempo para superar a crise econômica. Com a montanha de dinheiro que será gasto para sanar o sistema financeiro, o equilíbrio fiscal das principais economias do mundo ficará ameaçado.

Soma-se a isso a recessão que aos poucos vai ficando cada vez mais evidente. Dos Estados Unidos, vieram notícias ruins sobre a Microsoft, Pepsi e Intel. Todas as três companhias devem registrar ganhos menores este ano, com a perspectiva de menos vendas.

Com isso, as bolsas agora à tarde já operam mais para o negativo. O Ibovespa depois de subir mais de 7% pela manhã, chegou a cair 1,45%, e às 16h20m operava perto da estabilidade, com alta de 0,01%. O Dow Jones caía 1,97%; enquanto a S&P recuava 1,85%; e a Nasdaq, 4,01%.

Pelo menos, há uma coisa boa: as quedas não são tão fortes como as da semana passada. Sinal de que a crise aos poucos está perdendo o caráter emocional.

- A emergência já foi feita, agora precisamos ver quais serão as medidas para o médio e longo prazo - explicou o economista Alvaro Bandeira, da Ágora Corretora.

A crise está redefinindo nossos líderes

Gideon Rachman

Se a alta do mercado de segunda-feira realmente sinalizar uma virada na crise financeira mundial, o mundo saudará um salvador improvável. Dê um passo à frente Gordon Brown, o soturno primeiro-ministro do Reino Unido.

Até o estouro da crise, a imagem de Brown era de uma figura tragicômica: um homem que queria desesperadamente ser primeiro-ministro, mas que tinha provado ser irremediavelmente inadequado para o cargo.

Mas o plano de resgate de Brown foi adotado não apenas no Reino Unido, mas por todo o mundo. Na última sexta-feira, Paul Krugman, o novo prêmio Nobel de economia, elogiou o governo britânico por "exibir o tipo de pensamento claro que anda tão escasso na América". Ele escreveu: "Os Estados Unidos e a Europa devem apenas dizer: 'Sim, primeiro-ministro'. O plano britânico não é perfeito, mas... ele oferece de longe o melhor modelo disponível para um amplo esforço de resgate".

O encontro de cúpula europeu de emergência em Paris, no fim de semana, viu os 15 membros da zona do euro adotarem os planos de resgate a bancos que pareciam notavelmente com a iniciativa britânica. As autoridades britânicas, para as quais freqüentemente era dito que em uma grande crise econômica eles seriam irremediavelmente atropelados pela zona do euro, estão desfrutando de seu momento de desagravo.

As crises definem os políticos. A sorte contrastante de Brown e do presidente George W. Bush ilustra isso. Em tempos normais, Brown freqüentemente parece indeciso, soturno e robótico. Em tempos normais, Bush parece animado, decisivo e um sujeito normal. Mas, em uma crise, os modos de ambos se transformam -um para melhor e o outro para pior. Brown repentinamente parece calmo, determinado e no controle. Bush tem a tendência infeliz de parecer em pânico e fora de sua competência.

A atual crise financeira parece na verdade ter animado Brown. Quando um celular tocou em maio ao seu discurso no final da semana passada, o primeiro-ministro fez uma rara piada espontânea, especulando sobre se seria a notícia de outro banco entrando em colapso. Este tipo de piada pode soar como sendo de muito mau gosto. Mas de alguma forma funcionou. Brown se tornou humorista. E, além disso, sua platéia tinha confiança de que ele tinha controla da situação.

A presidência de Bush também pode ser definida por sua reação a crises - mas de um modo ruim. Imediatamente após os ataques terroristas em Nova York e Washington, ele desapareceu, apesar de que sob orientação do serviço secreto. Ele posteriormente se recuperou e fez alguns bons discursos. Mas o péssimo desempenho de Bush durante o furacão Katrina consolidou sua reputação de incompetência. "Brownie, você está fazendo um ótimo trabalho" - o comentário que ele dirigiu ao chefe da resposta do governo federal ao desastre - parecia ser o comentário definidor de seu mandato.

Mas agora ele tem um forte concorrente. O suposto comentário do presidente de que "esta porcaria pode afundar" foi a única coisa memorável que ele disse durante toda a crise financeira. Infelizmente, isso o fez soar como um texano na ponte do Titanic. Compare com o que disse Roosevelt: "A única coisa que devemos temer é o próprio medo".

Apesar de Brown ter se saído bem e Bush ter se saído mal, eles não são os únicos políticos atuando na crise financeira mundial. Logo, quais são os veredictos preliminares para os demais políticos?

Peer Steinbrück, o ministro das finanças alemão, conquistou o prêmio especial de bobo por seu triunfalismo prematuro. Ao sugerir no mês passado que "a crise se originou nos Estados Unidos e atingirá principalmente os Estados Unidos" ele tentou o destino. Angela Merkel, a chanceler alemã, também não se cobriu de glória. Ao apelar por uma resposta européia e então anunciar medidas alemãs unilaterais, isso fez com que parecesse inconsistente - para dizer de um modo educado.

Em comparação, Nicolas Sarkozy se saiu bem. "Tranqüilizador" não é uma palavra que geralmente se aplica ao hiperativo presidente francês. Mas Sarkozy pareceu enérgico e determinado. Como a França ocupa atualmente a presidência da União Européia, ele teve a tarefa de pesadelo de tentar elaborar uma resposta conjunta européia. No evento, o encontro de cúpula da noite de domingo, em Paris, foi uma ocasião muito mais bem-sucedida do que muitos encontros da UE para se discutir crises. Ao evitar uma farsa e apresentar uma frente unida ao mundo, Sarkozy salvou a UE de um maior embaraço.

Nos Estados Unidos, parece claro que a crise foi melhor para Barack Obama do que para John McCain. Provavelmente é verdade que uma campanha voltada à economia provavelmente favoreceria o candidato democrata em vez do republicano. Mas os dois candidatos também reagiram de forma diferente sob fogo. Nenhum deles ofereceu uma opinião particularmente notável sobre as origens ou a gestão da crise financeira. Mas o comportamento deles foi muito diferente. Os principais lemas para um líder em uma crise financeira são calma, consistência e controle -e Obama contou com os três. Em comparação, as reações iniciais de McCain foram frenéticas e contraditórias.

É claro, todos esses veredictos são altamente provisórios. A política é injusta: sair-se mal em uma crise pode liquidar um político, mas sair-se bem não é garantia de sucesso. No início da crise, era Hank Paulson, o secretário do Tesouro americano, quem era saudado como homem do momento. Agora é a vez de Brown. Se ocorrerem novas surpresas desagradáveis no sistema financeiro mundial, ele também poderá ser atropelado pelos eventos. Brown travou uma boa guerra. Mas mesmo assim ele ainda pode parar no lado perdedor.
14/10/2008


Gideon Rachman

Se a alta do mercado de segunda-feira realmente sinalizar uma virada na crise financeira mundial, o mundo saudará um salvador improvável. Dê um passo à frente Gordon Brown, o soturno primeiro-ministro do Reino Unido.

Até o estouro da crise, a imagem de Brown era de uma figura tragicômica: um homem que queria desesperadamente ser primeiro-ministro, mas que tinha provado ser irremediavelmente inadequado para o cargo.

Mas o plano de resgate de Brown foi adotado não apenas no Reino Unido, mas por todo o mundo. Na última sexta-feira, Paul Krugman, o novo prêmio Nobel de economia, elogiou o governo britânico por "exibir o tipo de pensamento claro que anda tão escasso na América". Ele escreveu: "Os Estados Unidos e a Europa devem apenas dizer: 'Sim, primeiro-ministro'. O plano britânico não é perfeito, mas... ele oferece de longe o melhor modelo disponível para um amplo esforço de resgate".

O encontro de cúpula europeu de emergência em Paris, no fim de semana, viu os 15 membros da zona do euro adotarem os planos de resgate a bancos que pareciam notavelmente com a iniciativa britânica. As autoridades britânicas, para as quais freqüentemente era dito que em uma grande crise econômica eles seriam irremediavelmente atropelados pela zona do euro, estão desfrutando de seu momento de desagravo.

As crises definem os políticos. A sorte contrastante de Brown e do presidente George W. Bush ilustra isso. Em tempos normais, Brown freqüentemente parece indeciso, soturno e robótico. Em tempos normais, Bush parece animado, decisivo e um sujeito normal. Mas, em uma crise, os modos de ambos se transformam -um para melhor e o outro para pior. Brown repentinamente parece calmo, determinado e no controle. Bush tem a tendência infeliz de parecer em pânico e fora de sua competência.

A atual crise financeira parece na verdade ter animado Brown. Quando um celular tocou em maio ao seu discurso no final da semana passada, o primeiro-ministro fez uma rara piada espontânea, especulando sobre se seria a notícia de outro banco entrando em colapso. Este tipo de piada pode soar como sendo de muito mau gosto. Mas de alguma forma funcionou. Brown se tornou humorista. E, além disso, sua platéia tinha confiança de que ele tinha controla da situação.

A presidência de Bush também pode ser definida por sua reação a crises - mas de um modo ruim. Imediatamente após os ataques terroristas em Nova York e Washington, ele desapareceu, apesar de que sob orientação do serviço secreto. Ele posteriormente se recuperou e fez alguns bons discursos. Mas o péssimo desempenho de Bush durante o furacão Katrina consolidou sua reputação de incompetência. "Brownie, você está fazendo um ótimo trabalho" - o comentário que ele dirigiu ao chefe da resposta do governo federal ao desastre - parecia ser o comentário definidor de seu mandato.

Mas agora ele tem um forte concorrente. O suposto comentário do presidente de que "esta porcaria pode afundar" foi a única coisa memorável que ele disse durante toda a crise financeira. Infelizmente, isso o fez soar como um texano na ponte do Titanic. Compare com o que disse Roosevelt: "A única coisa que devemos temer é o próprio medo".

Apesar de Brown ter se saído bem e Bush ter se saído mal, eles não são os únicos políticos atuando na crise financeira mundial. Logo, quais são os veredictos preliminares para os demais políticos?

Peer Steinbrück, o ministro das finanças alemão, conquistou o prêmio especial de bobo por seu triunfalismo prematuro. Ao sugerir no mês passado que "a crise se originou nos Estados Unidos e atingirá principalmente os Estados Unidos" ele tentou o destino. Angela Merkel, a chanceler alemã, também não se cobriu de glória. Ao apelar por uma resposta européia e então anunciar medidas alemãs unilaterais, isso fez com que parecesse inconsistente - para dizer de um modo educado.

Em comparação, Nicolas Sarkozy se saiu bem. "Tranqüilizador" não é uma palavra que geralmente se aplica ao hiperativo presidente francês. Mas Sarkozy pareceu enérgico e determinado. Como a França ocupa atualmente a presidência da União Européia, ele teve a tarefa de pesadelo de tentar elaborar uma resposta conjunta européia. No evento, o encontro de cúpula da noite de domingo, em Paris, foi uma ocasião muito mais bem-sucedida do que muitos encontros da UE para se discutir crises. Ao evitar uma farsa e apresentar uma frente unida ao mundo, Sarkozy salvou a UE de um maior embaraço.

Nos Estados Unidos, parece claro que a crise foi melhor para Barack Obama do que para John McCain. Provavelmente é verdade que uma campanha voltada à economia provavelmente favoreceria o candidato democrata em vez do republicano. Mas os dois candidatos também reagiram de forma diferente sob fogo. Nenhum deles ofereceu uma opinião particularmente notável sobre as origens ou a gestão da crise financeira. Mas o comportamento deles foi muito diferente. Os principais lemas para um líder em uma crise financeira são calma, consistência e controle -e Obama contou com os três. Em comparação, as reações iniciais de McCain foram frenéticas e contraditórias.

É claro, todos esses veredictos são altamente provisórios. A política é injusta: sair-se mal em uma crise pode liquidar um político, mas sair-se bem não é garantia de sucesso. No início da crise, era Hank Paulson, o secretário do Tesouro americano, quem era saudado como homem do momento. Agora é a vez de Brown. Se ocorrerem novas surpresas desagradáveis no sistema financeiro mundial, ele também poderá ser atropelado pelos eventos. Brown travou uma boa guerra. Mas mesmo assim ele ainda pode parar no lado perdedor.
Fonte: Financial Times

Anos turbulentos pela frente - Pedro S. Malan

Madrugada de sexta-feira, 10 de outubro. Escrevo da China, onde me encontro para reunião de conselho internacional de que participo. Acabo de ver o fechamento da Bolsa de Nova York na quinta-feira e escrevo enquanto aguardo a abertura das bolsas da Ásia. "Possa você viver em tempos desafiadores" é uma conhecida expressão chinesa, que nunca foi tão apropriada como na dramática crise ora em andamento, cujas conseqüências estarão conosco por muitos anos à frente.

Virou clichê, mas não menos verdadeiro por isto: crises desta magnitude acontecem em intervalos que se contam em muitas décadas. Não tenho dúvidas de que esta - como todas as anteriores - será superada em algum momento, ainda que a um custo extremamente elevado, tanto econômico como social. Como tampouco tenho dúvidas de que haverá outra crise - diferente - em algum momento futuro. Afinal, é o que nos ensina a história, sempre surpreendente, dos últimos 250 anos. E, tão importante quanto, é o que nos ensina a imutável natureza humana, que, como é sabido, é movida por uma contínua interação das forças da ambição, do medo, da ignorância e da necessidade de auto-estima e reconhecimento que carrega consigo todo ser humano.

Os mercados, e em particular os mercados financeiros, sempre foram, são e serão afetados pela interação dos elementos acima com as incertezas, os riscos e oportunidades que o futuro invariavelmente contém. Esses processos podem por vezes levar tanto a manifestações de "exuberância irracional" e de "ganância infecciosa", para usar duas expressões de Greenspan, como a "medos irracionais" e "pânicos infecciosos" como estamos vivendo, em progressiva gestação, há mais de um ano e experimentando, com especial virulência, no último mês e, muito particularmente, nestes últimos dias. Está evidente agora que a paralisia de crédito é a expressão de uma crise global de confiança que extrapolou de muito o mercado interbancário e começou a afetar o chamado setor real e as perspectivas de crescimento.

Vale lembrar que um ano atrás, no dia 9 de outubro de 2007, apesar de a crise estar clara desde agosto, a Bolsa de Nova York chegou ao nível mais alto de sua história, estimulada pela decisão do banco central norte-americano de dar início, em setembro, à trajetória declinante de sua taxa básica de juros, então em 5,25%. As bolsas reagiram com entusiasmo. Afinal, em outubro de 1987 quando a bolsa nova-iorquina teve a maior queda porcentual de sua história (até hoje) num único dia e o pânico tomou conta dos mercados, o Fed reduziu os juros três vezes em seis semanas e a situação se normalizou. Em setembro de 1998, quando a crise da moratória russa e a falência de um grande hedge fund levaram a outro começo de pânico, o Fed reduziu os juros por três vezes em sete semanas e o pânico se foi. A minirrecessão de 2001, agravada pelo ataque às torres gêmeas, em 11 de setembro, levou a outro surto de pânico, também contido por três reduções de taxa de juros em sete semanas, redução que continuou até o 1% de junho de 2003. Talvez muitos tenham imaginado que, em último caso, esta seria sempre a opção salvadora, amplamente testada, para crises de confiança e liquidez. O que explicaria a complacência que se instaurou nos mercados: o Fed estaria sempre atento. E, afinal de contas, o mundo estava experimentando o mais forte, o mais longo e o mais amplamente disseminado ciclo de expansão da história moderna.

Pois bem, na crise atual, não apenas os juros norte-americanos foram reduzidos de 5,25% para 1,5%, mas vários outros bancos centrais, em ação concertada, fizeram o mesmo nas últimas semanas. Um enorme arsenal de medidas vêm sendo tomadas por vários países desenvolvidos. Bancos centrais passaram de emprestadores de última instância a incorporar transitoriamente funções de compradores de última instância, de "market makers" e de "match makers" de última instância. Tesouros passaram a ter autorização legal para capitalizar bancos privados, comprar ativos de suas carteiras e oferecer garantias totais a depositantes e aplicadores. Bancos centrais e Tesouros passaram a estender um volume crescente de recursos a um número crescente de instituições bancárias e não bancárias, aceitando garantias de maior risco do que as que normalmente exigiriam.

A prioridade absoluta é afastar o pânico, fazer com que voltem a funcionar o sistema de pagamentos e o mercado interbancário - e presidir um processo ordenado de venda de ativos, capitalização e consolidação do sistema bancário que passará, inevitavelmente, por um schumpeteriano processo de "destruição criadora". E os bancos que restarem serão submetidos a uma supervisão e uma regulação mais eficazes que no passado.

Tomará tempo. Será duro. Afinal, as medidas excepcionais fazem sentido, mas vieram tarde para evitar que o pânico se instalasse. Os discursos do presidente Bush - como, de resto, de qualquer presidente isoladamente -, a esta altura, não terão maior efeito sobre os mercados. Só a efetiva implementação do programa de emergência aprovado pelo Congresso americano, um relativo sucesso do programa da retirada dos ativos tóxicos dos balanços dos bancos e um grau de cooperação internacional nunca antes alcançado dentre os principais Tesouros e bancos centrais dos países desenvolvidos.

E o Brasil? Bem o País só teria a ganhar se, além de contar, como conta, com um Banco Central atento e agindo, fosse capaz de deixar de lado discursos de palanque, bravatas e bazófias e mostrar que entende a gravidade do momento e que, portanto, entre outras coisas, não só vai revisar imediatamente o Orçamento de 2009, como as metas fiscais indicativas para o próximo triênio.

Os países relativamente menos afetados pela crise serão os mais capazes de mostrar com atos, e não discursos, sua capacidade de resposta à crise, retendo assim a confiança possível do resto do mundo.

Pedro S. Malan, economista, foi ministro da Fazenda no governo FHC E-mail: malan@estadao.com.br

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Mundo louco - Miriam Leitão

Nada do que está acontecendo é normal. Os tempos não são normais, são de crise aguda, mas a reação das autoridades econômicas e monetárias do mundo está piorando a crise em si, e deixando uma herança maldita para o futuro. Os Tesouros dos EUA e inglês vão virar banqueiros, comprando ações e até controle acionário de bancos privados. Se não é o fim do capitalismo, eles estão se esforçando!

A Islândia levou muito a sério o próprio nome — Iceland, terra do gelo — e congelou os depósitos de clientes ingleses; isto, depois de ter estatizado os bancos. Países periféricos podem tomar medidas estapafúrdias. O esquisito é a Islândia virar assunto nos mercados internacionais.

Ela não tem saído da primeira página nos últimos tempos. Ou pela reação desesperada do seu governo, dizendo que estava à beira da “falência nacional”, ou pelo empréstimo bilionário tomado junto à Rússia, ou pela estatização dos bancos.

Ontem foi pelo ataque aos ingleses.

As autoridades mundiais parecem baratas tontas, correndo de um lado para o outro, e isso realimenta o pânico. O propalado pacote de US$ 700 bilhões de resgate do secretário do Tesouro americano, Henry Paulson, é um capítulo à parte em matéria de proposta confusa feita pelas autoridades. Mas o mais importante agora é confirmar — de novo! — a avaliação do economista Nouriel Roubini: “O pacote é um não-evento.” Se tivesse tido o efeito que Paulson disse que teria, o secretário do Tesouro americano não estava ontem propondo fazer nos EUA o mesmo pacote inglês em que o Tesouro vira sócio dos bancos.

A versão americana é mais exagerada: ele quer comprar o controle acionário dos bancos. Se exibir neste plano a mesma perícia, destreza e respeito aos contribuintes que demonstrou no pacote de US$ 700 bilhões, os Estados Unidos terão acelerado a sua marcha rumo ao passado. Remoto.

É normal bancos centrais injetarem liquidez nos mercados em épocas de crise de liquidez, é normal a liberação de compulsório, é normal a queda das taxas de juros. Em época de risco de crise sistêmica começam as anomalias.

E é como anomalia que se entendem os pacotes de saneamento de sistema financeiro, como foi o Proer aqui, o caso das Savings&Loans nos anos 1980 nos Estados Unidos, ou o saneamento dos bancos japoneses.

Mas, nesta crise, o Fed foi além das anomalias esperáveis.

Ben Bernanke saiu de braços dados com o secretário do Tesouro num corpoacorpo no Parlamento para aprovar um plano do Executivo de compra de ativos podres em carteira dos bancos.

Não sobrou nada da antiga independência do banco central americano. Se ainda fosse o plano para acabar com todos os planos, tudo bem. Mas era um plano defeituoso, e foram inúmeros os economistas que apontaram os erros. Bernanke gosta de se definir como um professor de Economia. Como professor, está reprovado, por ter aprovado plano tão ruim.

Agora, o plano B não é mais a faxina de ativos tóxicos; é tomar conta da banca diretamente.

O rombo criado por salvações de bancos já supera US$ 2 trilhões e não se tem idéia de onde vai parar.

Paulson-Bernanke, esses ases do volante, deixaram um banco quebrar. Apenas um.

Salvaram todos os outros.

Mas este um que deixaram quebrar, o Lehman Brothers, está custando muito mais caro que todos os outros, porque detonou a pior crise de confiança já vista em 80 anos.

E é mesmo para desconfiar com o mundo entregue a esses gênios. O presidente Bush, esse lame duck, faz agora pronunciamentos tão diários quanto inúteis. Hoje falará novamente.

A atuação coordenada dos bancos centrais esta semana foi um momento de lucidez neste festival de maluquices.

E vinha surtindo efeito. Até que Paulson destrancou de novo o fantasma do armário, avisando que outros bancos poderiam quebrar. Ontem, o bom humor não atravessou um pregão. A Dow Jones, que chegou a estar positiva, fechou em menos 7,33%: S&P caiu 7,6%. Aqui, a Bovespa mostrou que o mercado não sabe para onde vai. Chegou a estar em alta de 4,8% e fechou em queda de 3,92%.

Agora já está ligado o círculo vicioso: a crise do mercado financeiro está produzindo efeitos na economia real, o que realimenta o pessimismo no mercado financeiro.

A queda de ontem nas bolsas americanas foi em parte pelas más, e previsíveis, notícias do mercado de automóveis americano. Que o PIB americano vai encolher, está dado. Uma economia que era movida a crédito barato e concedido de forma irresponsável, em que as dívidas refinanciadas geravam mais capacidade de consumo, obviamente encolhe quando o castelo de cartas desmonta. O erro foi de novo das autoridades, que não viram que a economia tinha tão insustentáveis fundamentos.

No Brasil, não se viu, ainda, nenhuma medida tresloucada.

Felizmente. O que houve de fora de propósito foi a convicção insensata de que a crise não nos atingiria porque estávamos sólidos, robustos, blindados; que aqui chegaria uma marolinha e outras tolices ditas pelos que nos governam. A demora de agir no câmbio produziu uma maxidesvalorização despropositada, de 50%, que está fazendo as empresas sangrarem. O problema aqui é este.

No mundo, parte da crise é provocada pela imperícia dos que governam os países ricos. É a maluquice dos líderes o pior neste momento de risco.

Economia da Islândia derrete e país teme quebra

Em poucas semanas, o governo da Islândia se reuniu para tratar de uma ameaça ao futuro da ilha: a elevação dos níveis do mar pelo derretimento das calotas polares. Hoje o problema é outro: o derretimento de sua economia. Ontem, o governo anunciou a nacionalização do maior banco do país e fechou a bolsa de valores, provocando a ira dos ingleses, que têm bilhões nos bancos da ilha. Para analistas, o país nórdico se transformou no exemplo mais concreto do que a crise pode fazer com uma das economias mais ricas do mundo, ameaçada até de "falência nacional".

Ontem mesmo, o Reino Unido ainda ameaçou ir à Justiça contra o governo da Islândia, pedindo indenizações de US$ 1,5 bilhão. Mais de cem prefeituras inglesas tinham investimentos em bancos islandeses e agora têm suas contas ameaçadas.

A Islândia também pode se tornar o primeiro país rico a pedir ajuda ao Fundo Monetário Internacional (FMI). "Nunca pensamos que isso aconteceria. A população vive um clima de insegurança", disse ao Estado um dos principais economistas do país, Snjólfur Ólafsson, professor do Instituto de Estudos Econômicos da Universidade de Reykjavik.

A Islândia tem apenas 304 mil habitantes, pouco menos que a população de Jundiaí (SP). Mas conseguiu nos últimos anos tornar-se um centro financeiro e referência mundial em qualidade de vida. Tem um dos índices de desenvolvimento social mais altos do planeta, elevada expectativa de vida, sistema educacional exemplar, 1% de desemprego e um dos maiores PIBs per capita: US$ 40 mil por ano por pessoa, mais de dez vezes superior ao do Brasil. Para os 304 mil habitantes, existem 340 mil celulares no país.

O problema é que grande parte dessa riqueza não estava baseada em sua produção de bacalhau e, sim, em atrair o sistema financeiro para a ilha. Os recursos depositados em bancos na Islândia chegaram a US$ 100 bilhões, ante um PIB de US$ 14 bilhões do país.

Depois de sucessivas crises nos anos 70 e 80, inflação de 100% e características de uma economia latino-americana, a Islândia optou por um modelo de desregulação total da economia. Friedman, Hayek e outros intelectuais do liberalismo não só apontaram o país como exemplo nos anos 90, como faziam freqüentes viagens e o transformaram em um campo de testes.

O governo privatizou empresas, a indústria de pesca, agência de viagens, gráficas, telefônicas e, claro, os bancos. O imposto de renda caiu pela metade e a carga tributária sobre fortunas foi abolida.

Mas, hoje, todos os modelos de desregulação estão sendo colocados no lixo pelo governo, que acaba de nacionalizar seus três maiores bancos. Ontem, foi a vez do Kaupthing, o maior banco do país, que em 26 de setembro declarou que o ano acabaria com "bons lucros". O Landsbanki e Glitnir também já haviam sido nacionalizados.

A bolsa de valores fechou, assim como todas as operações de câmbio, depois de uma desvalorização de mais de 50% da moeda local. As ações somente voltarão a ser negociadas na semana que vem, e o primeiro-ministro, Geir Haarde, já fala em risco de "falência nacional". Segundo ele, o país pagou o preço de estar se arriscando com volumes de dinheiro bem acima do que a economia de fato produz.

Mas o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, reclama que 300 mil clientes britânicos estão sem acesso a seus investimentos. O volume chegaria a quase US$ 1,5 bilhão, e o temor de Londres é de que o governo islandês não tenha como garantir esses depósitos. O resultado é que mais de cem prefeituras no Reino Unido também podem quebrar. Segundo o ministro das Finanças, Alastair Darling, o governo da Islândia reconhece que "não tinha como honrar suas obrigações". Em represália, Londres já congelou as ações dos bancos islandeses no Reino Unido.

"Aprendemos que não é sábio para um pequeno país tentar ter um papel de liderança no sistema financeiro internacional", disse o primeiro-ministro. O país, no melhor estilo de uma economia emergente, está recebendo uma missão do FMI. Além disso, a Rússia já anunciou que está disposta a emprestar 4 bilhões ao país.

Mundo está à beira da recessão, diz o FMI

O mundo está à beira de uma recessão e não há solução nacional para uma crise como esta, disse ontem o diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn. "Cooperação e coordenação nas ações são o preço do êxito", acrescentou.

A ação mais urgente, segundo ele, é restabelecer a confiança nos mercados financeiros e a medida mais importante para isso deve ser a recapitalização dos bancos. "Não sairemos desta situação sem recapitalizar suficientemente as instituições financeiras", insistiu. (Ler abaixo artigo especial de Strauss-Khan.)

A cooperação, disse o diretor-gerente do FMI, tem de ir muito além do entendimento entre os membros do Grupo dos Sete (G-7), formado pelas maiores potências capitalistas (Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá). É preciso, segundo ele, incluir no grupo mais quatro, cinco importantes atores da economia mundial. Mesmo assim, as soluções terão de valer para todos os países, "pois agora a crise envolve todo o mundo".

A ampliação do G-7 (G-8, quando a Rússia participa) é uma reivindicação do Brasil e de outros grandes países emergentes, mas o Strauss-Kahn não entrou nesses detalhes.

Ministros de Finanças e presidentes de bancos centrais das sete principais potências devem reunir-se hoje no Departamento do Tesouro americano. Essa reunião ocorre tradicionalmente como evento paralelo às assembléias do FMI. Os comunicados desses encontros são, em geral, previsíveis, mas, desta vez, o assunto é a maior crise desde os anos 30.

Já houve nesta semana uma grande ação coordenada, na quarta-feira, quando bancos centrais das economias mais desenvolvidas cortaram 0,5 ponto porcentual dos juros básicos. A iniciativa, embora considerada positiva, foi insuficiente para mudar o humor nos mercados. As bolsas continuaram a fechar em queda nos últimos dois dias. Ontem, o Índice Dow Jones da Bolsa de Nova York despencou 7,3%, levando o Ibovespa novamente para baixo.

A discussão no G-7 deverá envolver propostas de ações mais ambiciosas, como os amplos programas de auxílio a instituições financeiras já aprovados nos Estados Unidos e no Reino Unido. O diretor-gerente do FMI, normalmente convidado para esses encontros do G-7, deverá insistir nas idéias de recapitalização, recolhimento de ativos podres (já autorizado pelo Congresso americano) e garantias para os depositantes.

Haverá pressão, provavelmente, sobre a maioria dos membros da União Européia e sobre o Japão. Dentre os europeus, só o governo do Reino Unido tem acompanhado mais ou menos de perto a ação mais ampla desenvolvida pelas autoridades americanas.

Ontem, Strauss-Kahn cobrou cooperação principalmente dos governos da Europa, insistindo num ponto já tocado por outros dirigentes do FMI. Mas ele demonstra ambicionar um papel mais amplo para o FMI. Esta crise, insistiu, não será resolvida só com os instrumentos monetários e fiscais. Os governos terão de usar também instrumentos financeiros. O Fundo, segundo ele, é a única instituição internacional capaz de trabalhar com os vínculos entre os setores financeiro e real.

No sábado, o espetáculo será mais amplo, com a reunião extraordinária, marcada para as 18 horas, do Grupo dos 20 (G-20), formado por grandes economias desenvolvidas e emergentes. A convocação do encontro foi sugerida pelo secretário do Tesouro americano, Henry Paulson, ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, presidente do grupo neste ano.

Além dos membros do G-7, o G-20 inclui Brasil, África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, China, Índia, Indonésia, México, Rússia, Coréia do Sul e Turquia. A União Européia também é representada como bloco.

Os ministros do Brasil e de outros emergentes poderão reclamar da crise causada pelas instituições financeiras do mundo rico e cobrar ações corretivas, mas a turbulência internacional afeta seus países de forma diferenciada. Apresentam graus diferentes de vulnerabilidade nas contas externas e diferentes níveis de inflação e de solidez nas contas públicas.

Para o Brasil, comentou Strauss-Kahn, a crise terá como principal conseqüência a redução do crescimento, de 5,2% em 2008 para 3,5% em 2009, segundo a estimativa contida no Panorama Econômico Mundial divulgado no dia anterior.

Nenhum país está imune à crise, repetiu o diretor-gerente do FMI, "mas o Brasil tem fundamentos fortes, a política econômica foi administrada corretamente nos últimos anos, um monte de reservas foi acumulado e a economia do País está em boa forma".

Bem mais complicada que a dos emergentes é a situação dos países pobres, em geral importadores de alimentos e, em muitos casos, também de petróleo. É a "outra crise", segundo a expressão de Strauss-Kahn.

O presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, tratou principalmente da situação desses países, na entrevista concedida também ontem na sede do FMI. Em julho, numa reunião do G-8, lembrou Zoellick, ele mencionou o duplo impacto sofrido pelos países em desenvolvimento - a alta de preços do petróleo e da comida.

"Agora, o golpe é triplo - comida, combustível e finanças - ameaçam não só derrubar as pessoas pobres, mas mantê-las no chão", disse Zoellick. Aos países mais pobres e sujeitos a dificuldades maiores, o Fundo já oferece ajuda financeira e assistência técnica, por meio de um programa especial, lembrou Strauss-Kahn, e continuará a oferecer enquanto se prolongarem os efeitos da crise.

Esses países foram atingidos principalmente pelo aumento dos preços de produtos básicos e sua situação ainda é grave, mesmo com o recuo das cotações dos produtos agrícolas e do petróleo. E os pobres, lembrou Strauss-Khan, são os primeiros a ser afetados pela inflação.

Roubini fala em depressão e crise sistêmica global

O economista Nouriel Roubini, o bola de cristal de ouro do mundo, que previu tudo isso que está aí, mandou para seus clientes uma análise demolidora sobre os próximos riscos.

O que pode acontecer de pior a um sistema financeiro? O risco sistêmico. Pior que isso só um risco sistêmico global. É o que ele acha que pode acontecer agora.

O que de pior pode acontecer à economia real? Uma depressão. Pois esta palavra está na análise dele.

O pior de Roubini é que quando ele previu a recessão, a crise financeira e a quebra de instituições até como a gigante Fannie Mae e Freddy Mac ele foi ridicularizado pelos economistas do mundo inteiro. Riram dele. Isso foi em 2006. Em 2007, ninguém mais achava muita graça, mas a frase mais comum sobre que ouvi de alguns bons economistas brasileiros é: até relógio está certo duas vezes por dia. O pior de Roubini é que ele tem estado certo o tempo todo. E agora dobra a aposta. "O mundo está em um severo risco de um derretimento financeira global sistêmico e uma severa depressão global".

Ele acha que por isso é necessário uma ação urgente global. Como o G-7 está reunido neste fim de semana, quem sabe eles são tomados pelo sentido de urgência.

Quando ele fala global, ele está falando principalmente de "Estados Unidos e economias desenvolvidas". Ufa! nunca gostei tanto de não estar na lista dos países mais ricos. O problema é que os Estados Unidos, Europa, Japão, Canadá, Austrália, Nova Zelândia representam, ele lembrou, 55% do PIB mundial e por isso afetarão todos os outros países se entrarem todos em recessão.

-Por isso, mesmo países com bom desempenho como os Brics - Brasil, Russia, India e China, estão sob ameaça de um "hard landing" ( uma queda forte e rápida do nível de atividade).

A tese dele desde o começo é que existia um sistema bancário na sombra. São os fundos, bancos de investimento, brokers dealers, não bancos emissores de hipotecas, firmas de private equities, tudo aquilo que estava fora do radar das autoridades. Ele disse que agora está se vendo um desmonte desse sistema das sombras e isso é que está por trás da queda livre das ações e da paralisação do sistema bancário com as taxas de riscos subindo muito e os negócios parando.

Previsões pessimistas têm uma vantagem: alertam as autoridades para o tamanho do risco e por isso ajudam a prevenir o pior. Essa é a grande vantagem de Roubini, que tem sido o mais pessimista dos economistas do mundo e tem acertado com uma precisão de relógio, infelizmente. Em parte porque quem deveria levá-lo a sério ainda não levou. Acham que ele é um exagerado.

US$ 4 trilhões desapareceram das Bolsas esta semana

A gente se animava com algumas horas de alívio, mas durou pouco. Está virando desespero novamente. O alívio durou pouco porque toda hora aparece um novo fantasma voando. Por exemplo, muitos investidores que compraram papéis do Lehman Brothers tinham se garantido e comprado também um seguro contra esse papel. Quem vendeu o seguro agora vai ter que pagar. Portanto, o Lehman Brothers quebrou há quase um mês, no dia 15 de setembro, mas ainda está provocando medo e prejuízo.

A Islândia, que é um país muito pequeno, possui depósitos nos bancos que são dez vezes o seu PIB. E na quinta-feira, o governo avisou que os bancos estão quebrados e que ele só vai garantir depósito dos islandeses. Com isso, há muito dinheiro inglês que agora está congelado na terra do gelo. Em resposta, a Inglaterra reagiu usando uma lei antiterror dizendo que também está congelando dinheiro islandês no país.

Só nesta semana, US$ 4 trilhões desapareceram das Bolsas de Valores. São quase R$ 9 trilhões. Três Brasis desapareceram. Este dinheiro, na verdade, é um dinheiro um pouco virtual, porque as pessoas só o teriam na mão se vendessem as ações. O prejuízo só vira realidade se você vende ação, tornando-o real.

O novo plano do secretário de Tesouro americano, Henry Paulson, de ser sócio dos bancos e ter ações dos bancos representa o fim do capitalismo. Nos Estados Unidos, o Tesouro vai ser banqueiro, dono dos bancos, significa também que aquele plano de US$ 700 bilhões tão falado, tão comentado e tão discutido, fracassou, porque já estão passando para um plano B, que é virar donos dos bancos.

As perdas milionárias não se resumem às Bolsas. A crise fez novas vítimas no setor produtivo. No Brasil, a queda das ações tem outra razão, que é só nossa: os prejuízos das empresas brasileiras com o dólar alto.

Sadia e Aracruz já anunciaram seus prejuízos. A Votorantim, uma das maiores empresas brasileiras, disse que perdeu dinheiro também. Não anunciou quanto, mas tranqüilizou o mercado: já encerrou todos os negócios no futuro de dólar, aquelas apostas de que o dólar não subiria e que estão prejudicando as empresas, provocando prejuízos.

Na quinta-feira, foi a Cosan, empresa de açúcar e álcool, a anunciar que o dólar alto vai aumentar suas receitas, mas também a sua dívida. Empresas imobiliárias também estão caindo na Bolsa por medo de que o setor tenha que adiar planos e investimentos.

O Banco Central está se preparando para dias piores. A regulamentação dessa última medida provisória mostrou que ele pode ir muito além da ação tradicional do BC.

O que é normal? Emprestar pelo redesconto, esta espécie de “cheque especial” para os bancos, por prazo curto. Nesses casos, o Banco Central recebe como garantia título público. Isso sempre foi feito. Agora, o BC poderá aceitar como garantia empréstimo consignado, crédito para compra de veículo, financiamento imobiliário – o que os bancos tiverem em carteira.

O BC pode emprestar por um ano para os bancos, mas interfere na administração: limita os salários dos executivos e os dividendos dos acionistas. Isto é uma cópia do que foi feito nos Estados Unidos.

Mas o Brasil não tem uma situação como a dos americanos, sempre é bom frisar isso. O Banco Central está apenas querendo ter agilidade caso essa crise de crédito externo traga algum problema para bancos brasileiros. A venda de reservas melhorou o clima no mercado de câmbio, mas talvez ele tenha que fazer novas vendas de reserva. Tem gente que critica, mas as reservas eram para enfrentar dias chuvosos e está chovendo um bocado.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Brigitte Bardot chama Sarah Palin de "irresponsável"


A ex-atriz francesa Brigitte Bardot enviou nesta terça-feira uma carta aberta a Sarah Palin, governadora do Alasca republicana que concorre para vice-presidente dos Estados Unidos, acusando-a de "total irresponsabilidade" com o ambiente. "Em nome do respeito e da preservação da natureza, desejo que você perca essas eleições, já que o mundo sairá ganhando."

Bardot é presidente da fundação de defesa dos animais que leva seu nome.
AP
Sarah Palin tem o hobby de caçar no Alasca; ativista, a ex-atriz francesa Brigitte Bardot criticou a candidata a vice republicana
Sarah Palin tem o hobby de caçar no Alasca; ativista, a ex-atriz francesa Brigitte Bardot criticou a candidata a vice republicana

"Senhora, ao negar a responsabilidade dos seres humanos no aquecimento global, ao militar em favor do porte de armas e do direito de dispará-las no que quer que seja [Palin tem como hobby caçar], e com falas de uma desconcertante estupidez, você envergonha as mulheres e representa uma terrível ameaça, uma verdadeira catástrofe ecológica", escreveu a ex-atriz.

Bardot ressaltou que Palin defende a exploração de petróleo na Reserva Nacional de Vida Selvagem e é contra a proteção de ursos polares, ameaçados pelo aquecimento global, "o que é testemunho da sua total irresponsabilidade, da sua incapacidade de proteger ou de, simplesmente, respeitar a vida animal".

Recentemente, Palin recuou da afirmação de que o aquecimento global não é fruto dos atos humanos para se alinhar ao companheiro de chapa, John McCain. Ela afirmou que, de fato, "os cientistas provaram" que as ações humanas "certamente podem estar contribuindo para a questão do aquecimento global".

No debate contra o candidato a vice democrata, Joe Biden, na última quinta-feira (2), Palin disse que quer "fazer algo" contra o aquecimento global. "Não vou culpar só as atividades humanas pela mudança climática pois o clima do mundo tem fases cíclicas, e na história temos visto mudanças".

Fonte: Folha online

A crise já é global e não pára - Miriam Leitao

A crise é global e não só dos EUA, deu o recado o presidente americano, George W. Bush. Algumas das medidas que já aconteceram em vários países pelo mundo:

- EUA: recessão, bancos quebrados e pacote de socorro de US$ 700 bilhões; país de nascimento do famoso “sub-prime”. Bush que agora fala diariamente sobre o assunto admitiu que a crise americana virou uma crise global.

- Inglaterra: recessão e socorro a bancos Northern Rock, e Bradford & Bingley.

- União Européia: países em recessão, estatização de banco na Alemanha, reuniões constantes de líderes, elevação de garantias para depósitos.

- Islândia: estatização de todos os bancos do país e um pedido de empréstimo à Rússia.

- Irlanda: governo se comprometeu e é obrigado a garantir depósitos bancários para evitar corrida e saques.

- Rússia: Injeção de quase US$ 40 bi em bancos estatais. Bolsas paralisam por quedas no pregão várias vezes.

- Brasil: dois circuit breaks em um dia, pela primeira vez desde 1999, pacote do governo injetar liquidez no mercado.

- Austrália: corte de juros em 1 ponto percentual.

- Israel: corte de juros em 0,50 ponto percentual.

- Bélgica: elevou a garantia bancária até US$100 mil.

- Espanha: criou um fundo de 30 bilhões de euros e elevou garantias para depósitos.

- Dinamarca: subiu juros para 5% para proteger a moeda.

E com certeza teve mais. Quem lembrar, pode comentar.

''The giant sucking sound'' Ilan Goldfajn

As conseqüências da crise chegaram definitivamente ao Brasil. Ao fundo, escuta-se um som gigante. É o crédito sendo sugado e desaparecendo em todos os cantos do mundo. Quem precisa de crédito para terminar um projeto ou simplesmente financiar seu negócio está com dificuldades: o crédito doméstico tem ficado mais escasso e caro, como resultado da busca de alternativas ao financiamento externo. O Brasil está (estava?) no auge do ciclo de investimentos. Como será o fim desta crise? Como o Brasil deve reagir?

Nos EUA, o "giant sucking sound" (som de sucção gigante) costuma se referir à perda de empregos para o resto do mundo. Ross Perot, candidato à eleição presidencial americana de 1992, cunhou a expressão na sua investida contra o tratado de livre comércio dos EUA com o México (e Canadá). Depois, outros políticos a usaram temendo perdas de emprego para a Europa Oriental e, finalmente, para a China. Não ocorreram as temidas perdas de emprego nos EUA. Agora, essa expressão pode ser usada no sentido contrário. Quem estaria sugando o resto do mundo é o sistema financeiro nos EUA (e na Europa). Sugando capital e crédito, não empregos. E o resto do mundo está sentindo essa pressão.

Há pelo menos dois canais de transmissão da crise externa para o Brasil. O primeiro é o canal financeiro. A crise financeira internacional caracteriza-se por uma necessidade aguda de capital por parte das instituições financeiras que vendem ativos e restringem o crédito. A redução do crédito atinge clientes no mundo todo, sejam americanos, chineses ou brasileiros. A falta de crédito espalha-se pelo mundo. Por exemplo, no momento em que clientes brasileiros ficam sem crédito lá fora, recorrem aos bancos no Brasil, o que aumenta sobremaneira a necessidade de recursos e pressiona o mercado aqui dentro. O crédito doméstico fica escasso e consideravelmente mais caro. A falta de crédito também se espalha pelo receio de dias piores pela frente, questiona-se o grau de inadimplência adiante.

O leitor deve estar-se perguntando: para onde está indo todo esse dinheiro que se está retraindo? O que significa fazer caixa, recompor capital?

No limite, significa aplicar os recursos em ativos considerados seguros (baixíssimo risco de calote) e de alta liquidez (disponíveis imediatamente sem custo). Os investidores têm desconfiado cada vez mais dos bancos e de outras instituições financeiras. Resta investir nos governos, comprando seus títulos, que estão cada vez mais demandados e, conseqüentemente, mais caros (pagando juros cada vez menores). Paradoxal, para alguns (já que os EUA são o centro da crise), os títulos do governo americano têm sido considerados os mais seguros e o dólar se tem valorizando em relação às outras moedas do mundo.

Na medida em que o fluxo de recursos está indo em direção aos governos, estes têm tentado reciclá-los de volta ao sistema, na medida do possível. Os bancos centrais das economias desenvolvidas têm oferecido linhas de financiamento e empréstimos aos bancos. Os governos também têm resgatado instituições (como a seguradora AIG, nos EUA, e o Banco Fortis, na Europa) e aprovado pacotes de ajuda (como os U$ 700 bilhões dos EUA). Mas o aperto continua.

O segundo canal de transmissão da crise é via queda dos preços e volumes das exportações brasileiras. Nos últimos anos, com o bom momento da economia mundial, tanto o volume quanto os preços das nossas exportações subiram consideravelmente (os preços subiram 120% de janeiro de 2003 a julho 2008), gerando superávits comerciais, assim como as importações, permitindo um crescimento maior da economia, sem aumento da inflação. Agora, os preços das exportações (bem como os volumes) estão recuando, invertendo a direção dos efeitos acima.

Qual a conseqüência desta crise? O PIB mundial deve desacelerar significativamente, assim como o do Brasil. Economistas estimam - na medida do possível, dada a incerteza elevada, hoje - um crescimento médio em torno de 3%-3,5% para o ano que vem. Essa taxa poderia ser considerada moderada, mas não muito. Se o Brasil parar de crescer a partir de janeiro, a média do produto interno bruto (PIB) de 2009 ainda vai ser maior que a média de 2008 em 1,4% (o chamado "carry" do crescimento). Um crescimento de 3% em 2009 significa um crescimento marginal nesse ano em torno de apenas (ou será ainda?) 1,6%.

Qual deveria ser a reação de política econômica no Brasil? Deveríamos ter uma política anticíclica tentando substituir a falta de crédito externo pelo interno?

Na minha visão, nem tanto ao mar, que afunde todo mundo, nem tanto à terra, de forma a ignorar a necessidade do ajuste aos novos tempos. Por um lado, é fundamental assegurar o funcionamento dos mercados no Brasil, provendo liquidez quando há paralisia, evitando que haja uma parada brusca de crédito no País, que pode ter conseqüências mais acentuadas sobre a economia brasileira. Nesse sentido, o Banco Central tem lançado medidas como a redução de compulsórios, em casos específicos, e o leilão de linhas de financiamento em dólares. Por outro lado, uma intervenção maciça do governo, por meio dos bancos públicos, para tentar manter o crescimento nos níveis atuais (5,5%-6%), poderia ser ineficaz, apenas inflacionária (por exemplo, essa política pressionaria a conta corrente, num ambiente sem financiamento internacional adequado, e levaria à depreciação do câmbio).

Em suma, há um som de sucção no ar, o crédito está-se retraindo no mundo. O período de bonança na economia mundial rapidamente se esvaiu, assim como o período de opções fáceis. Decisões adequadas neste momento podem significar uma melhor travessia da crise e uma saída em posição internacional favorável no futuro.

Ilan Goldfajn, sócio da Ciano Investimentos, diretor do Iepe da Casa das Garças, é professor da PUC-Rio. E-mail: igoldfajn@cianoinvest.com.br